A Ferrari e seu mundo arranjado

“O direito à felicidade é a nossa grande falácia: hoje somos superficiais até do ponto de vista das pedras. Já Tocqueville, no século 19, temia que a `mania de felicidade` tornassse todos nós os tolos do futuro”, diz Luiz Felipe Pondé, em sua coluna na Ilustrada de hoje (26/07/2010). Concordo com Pondé e ainda me arrepio diante dessa massa tola que aceita absurdos como, por exemplo,  a vergonhosa postura da Ferrari ontem na F1. Fabio Seixas disse tudo que eu diria,  melhor elaborado, por isso reproduzo o seu post  aqui:

“Porque, num replay do GP da Áustria de 2002, a Ferrari deu uma ordem expressa e escandalosa para inversão de posições entre seus dois pilotos. E a ordem foi expressamente e escandalosamente cumprida. Massa pilotava bem, liderava o GP da Alemanha, tinha enormes chances de encerrar um jejum de 27 provas sem vitória exatamente no dia em que seu acidente na Hungria completava um ano. Mas, a 18 voltas do fim, o rádio foi acionado. E o brasileiro praticamente parou o carro para Alonso passar. 

Por parte da Ferrari e de Alonso, falcatrua, marmelada, falta de esportividade. Por parte de Massa, e é triste escrever isso oito anos depois, acomodação, subserviência, falta de coragem. Uma mancha enorme que encobrirá para sempre a prova de Hockenheim, que era razoável até então.

Na largada, Massa se deu bem. Enquanto Vettel se preocupava em espremer Alonso pelo flanco direito, o brasileiro só precisou aproveitar a avenida à sua frente para alcançar a ponta. Talentoso, sim. Promissor, sem dúvida. Mas imaturo, infantil e bobo, o Vettel. Largando na pole, ele só tinha que acelerar forte e mirar a primeira curva. Preferiu mandar Alonso pro muro, se deu mal, protagonizou mais um vexame, passou mais um atestado de pouca inteligência.

Ao fim da primeira volta, Massa, Alonso, Vettel, Hamilton, Webber, Button, Kubica, Schumacher, Rosberg e Kobayashi. Barrichello, oitavo no grid, largou mal e caiu para 11°.

Logo de cara, Buemi, Sutil, Alguersuari e Liuzzi foram para os boxes. O primeiro, para abandonar após um toque. Os outros três, para jogar fora os pneus moles e colocar os mais duros, uma aposta. Lá na frente, diferenças estáveis entre os primeiros colocados. Nas dez primeira voltas, Massa mantinha cerca de 1s5 sobre Alonso, que abria 2s1 sobre Vettel.

Na 13ª volta, o alemão decidiu agitar de novo as coisas. Foi para os boxes, colocou os pneus mais duros. Webber parou logo depois. Na 14ª, a Ferrari, então, chamou Alonso. Ué, mas não era Massa que estava liderando? Sim. A Ferrari olhou para a tabela do campeonato, e não para a classificação da corrida, ao decidir sua estratégia. Bem, com tudo isso, o brasileiro só foi aos boxes na 15ª. Voltou atrás de Button, mas à frente de Alonso. Com apenas 0s 6 de vantagem, porém. Sofreu para aquecer pneus, travou roda algumas vezes, foi acossado.

Na 21ª, Alonso atacou, Massa segurou a posição. E então o espanhol chorou no rádio: “Isso é ridículo”. Ridícula foi a chiadeira. Quer passar, então passa, ué. Ele já havia sido beneficiado nos pits. O que mais ele queria? Um tapete vermelho para ultrapassar? Na 23ª, Button foi o último do pelotão da frente a parar, reestabelecendo a ordem “normal” da prova: Massa, Alonso, Vettel, Hamilton, Button, Webber.

Coincidência ou não, fato é que depois do piti via rádio, Alonso perdeu contato com Massa, que começou a cravar voltas voadoras. Na 27ª volta, a vantagem do brasileiro era de 3s4. O espanhol só começou a reagir na volta seguinte, quando cravou 1min18s075. Massa respondeu na 30ª: 1min17s991. Na 31ª, Alonso fez 1min17s751. E assim ficou, um jogo de xadrez entre os dois ferraristas, mas com o brasileiro mantendo uma folga razoavelmente confortável na frente, Vettel, lembram dele? Aquele trapalhão da largada? Pois é, ficava cada vez mais distante das Ferrari sem ameaçar Alonso e sem sofrer ameaças de Hamilton.

A corrida só voltou a ganhar alguma emoção depois da 40ª volta, quando alguns pilotos começaram a fazer as contas do consumo de combustível e Alonso reduziu sua desvantagem para menos de 1s.

Na 49ª, então, o esporte foi jogado no lixo.

Pelo rádio, Massa ouviu o seguinte: “Fernando está mais rápido do que você. Você entendeu a mensagem?”. A primeira frase, bem pausada, quase letra a letra.  Em outras palavras, “deixe-o passar”. Metros depois, Massa praticamente parou o carro para Alonso passar. Um replay do que aconteceu no GP da Áustria de 2002. O resto da prova não interessa. Vitória de Alonso, com Massa em segundo e Vettel em terceiro. E enquanto o pódio sem graça acontecia, Luca Colajanni, assessor de imprensa da Ferrari, ficou nervosinho ao ser questionado sobre jogo de equipe. “Apenas dissemos que Fernando estava mais rápido. Você deveria aprender inglês”, disse, nas rádios Bandeirantes e BandNews FM.

A Ferrari pensa que o resto do mundo é idiota. E talvez sejamos mesmo, de continuar acompanhando um campeonato do qual ela participa”. (Escrito por Fábio Seixas)