FAKE NEWS: O que isso tem a ver comigo?

“Quando chega ao grupo de WhatsApp de sua família, ou em seu perfil na rede social, uma notícia bombástica sobre o momento político ou, por exemplo, alguma denúncia a respeito da eficácia da vacina contra a febre-amarela distribuída nos postos de saúde, ou até mesmo alguma declaração polêmica atribuída ao Papa Francisco, qual é a sua primeira atitude: ler, verificar a sua veracidade, ou compartilhá-la imediatamente com os amigos?

É diante de situações comuns como essas que se disseminam as chamadas fake news, objeto da mensagem do Papa Francisco para o 52º Dia Mundial das Comunicações Sociais, publicada no dia 24. Essas notícias falsas, no entanto, não nascem de repente, mas são fruto de um contexto potencializado pelas redes sociais digitais chamado “pós-verdade”. Eleita palavra do ano em 2016 pelo dicionário britânico Oxford, a “pós-verdade” ganhou relevância nas mídias após a ampla veiculação de notícias falsas durante as eleições presidenciais dos Estados Unidos.

Post-truth (pós-verdade): relativo ou referente a circunstâncias nas quais os fatos objetivos são menos influentes na opinião pública do que as emoções e as crenças pessoais”, define o verbete do termo no dicionário. Em outras palavras, é quando os fatos importam menos do que aquilo em que as pessoas escolhem acreditar, ou seja, “quando a verdade é substituída pela opinião”.

 DISSEMINAÇÃO

Para a Pollyana Ferrari, Professora de Jornalismo da PUC-SP e pesquisadora em Comunicação Digital, as redes sociais, principais fontes de informação da atualidade, colaboraram para a disseminação em larga escala das notícias falsas. “Muito rapidamente se dissemina e se produz notícias falsas hoje em dia. Existe uma polarização de vozes nas redes e isso favorece ainda mais para essa prática”, explicou Ferrari, ao O SÃO PAULO. Ela iniciou sua pesquisa sobre o tema para seu pós-doutorado pela Universidade Beira Interior, em Portugal.

A Professora destacou, no entanto, que o fenômeno das fake news não é novo. “Notícias falsas criadas por interesse pessoal, partidário, econômico, sempre existiram. Quando dizíamos a ‘imprensa marrom’ ou os tabloides sensacionalistas, nos referíamos a isso. Mas nas redes sociais o alcance é muito maior e mais rápido”.

Um dos fatores que potencializaram a propagação de fake news são as chamadas bolhas das redes sociais, geradas pelos algoritmos dos desenvolvedores dessas mídias, que fazem com que o usuário receba em seus perfis cada vez mais informações relacionadas aos seus gostos e interesses pessoais. “Quanto mais eu gosto de um tema, mais ele aparece na minha rede, seja a pesquisa de um produto, ou um assunto de viagem. Isso vai crescendo como uma avalanche”, salientou Ferrari.

Na avaliação da Especialista, essas bolhas fazem com que as pessoas se isolem cada vez mais em grupos pequenos nos quais não se toleram opiniões divergentes. Isso favorece a crescente polarização de ideias que se vê nas redes sociais. “Quando alguém diz ‘não brigo mais no Facebook, porque fiz uma limpeza dos meus amigos e agora só falo com quem pensa igual a mim’, é muito ruim, porque todo mundo não é igual”.

BOLHAS

O Papa Francisco reforça essa ideia quando afirma que a dificuldade em desvendar e erradicar as fake news se deve também ao fato de as pessoas interagirem muitas vezes dentro de ambientes digitais “homogêneos e impermeáveis a perspectivas e opiniões divergentes”. “Esta lógica da desinformação tem êxito, porque, em vez de haver um confronto sadio com outras fontes de informação (que poderia colocar positivamente em discussão os preconceitos e abrir para um diálogo construtivo), corre-se o risco de se tornar atores involuntários na difusão de opiniões tendenciosas e infundadas”.

EM BUSCA DE LIKES

É preciso ter claro que não são apenas fake news aquelas notícias completamente falsas, mas também as informações construídas de modo que a opinião de quem a produz são mais valorizada do que a verdade dos fatos, geralmente para atender a interesses políticos, ideológicos e até comerciais.

Nesse aspecto, com o objetivo de obter “cliques”, “curtidas”, em seus perfis ou páginas, muitos veículos manipulam manchetes, títulos ou informações completas, quando não produzem notícias totalmente falsas em meio a outras verdadeiras em busca de mais acessos e maior audiência.

O mesmo fenômeno acontece com os indivíduos que compartilham as informações sem verificarem sua autenticidade pelo simples desejo de obterem mais likes, mais repercussão e visibilidade. “Quando comecei a pesquisar sobre as fake news, percebi que o lastro com o real está se perdendo, e a ‘persona digital’ tem falado mais alto” (Leia a entrevista na íntegra no site do Jornal o São Paulo).